Domínio público |
Supermercados são lugares que sempre me causaram sentimentos estranhos. Eu nunca fui (mesmo em alguns momentos de maior poder aquisitivo), daquelas que adoravam sair para consumir. Passei por muita coisa na vida, tive momentos de muita necessidade, de falta de alimento, em diversos períodos, e ir ao supermercado nesses momentos é uma experiência escalavradora.
Há umas semanas atrás, eu estava na fila de um desses grandes supermercados e notei uma senhorinha atrás de mim, acompanhada por uma adolescente; a senhorinha segurava uns pacotes de biscoitos e umas três bandejas de iogurtes, daqueles mais baratos que não passam de um composto engrossado com uma espécie de amido. As duas vestiam-se de maneira simples, notava-se que a senhora estava um pouco desconfortável e orgulhosa ao mesmo tempo. Pensei: _ Que fofinha, deve estar com os netinhos em casa, tentando agradar. _ Na minha observação silenciosa, ouvi a adolescente dizer: _ Põe uns de volta, vó, não precisa disso tudo! _A avó insistiu: _Não, é pra vocês, é pra vocês! _ Nesse momento, senti um nó na garganta e meus olhos começaram a arder, e quem me conhece sabe que não gosto de chorar, embora tenha vontade muitas vezes. Eu tive vontade de chorar porque é muito triste querer agradar aos que amamos, mesmo não tendo grandes condições, e porque a menina reconheceu os esforços da avó naquele intento e se preocupou com suas finanças e suas faltas. Também me emocionei porque aquela senhora, com seu pequeno dinheiro, sentiu-se bem por poder agradar aos seus netinhos, talvez a única fonte de felicidade, quem sabe? Principalmente, senti-me triste porque a maioria das pessoas não podem comprar uma bandeja de iogurte.
Cada vez que vou ao supermercado sinto-me mais triste porque cenas que não via há muito tempo, talvez desde os anos 80, estão voltando a acontecer. Os supermercados estão ficando cheios de seguranças para nos vigiar, desconfiando de todos. O que dói mais é ver itens que antes eram rejeitados voltarem para as principais prateleiras, e ver as pessoas revirando mercadorias, não tão em bom estado, mas com ótimos preços, a fim de encontrar algo que possa fazer jus à próxima refeição. Dói ver as pessoas de chinelos e camisa surrada desconfiadas da desconfiança de quem as olha. Dói ver o crescimento de pedintes do lado de fora. Dói ouvir na TV que o agronegócio bateu recordes de lucros em um ano de pandemia e miséria e mesmo assim o óleo de soja, o arroz e o feijão mais que dobraram seus preços. Qual a vantagem desse recorde para a maioria do povo sendo que cada vez mais, menos empregos esses tais agronegócios oferecem e a comida básica fica inacessível? Algo não bate.
É no supermercado que a situação da sociedade se denuncia.
Uma vez, quando criança, fui ao supermercado com meus amiguinhos, todos pobres; nossa alimentação era baseada em fubá suado no café da manhã e arroz com feijão quando dava. Os meninos, no supermercado, roubaram umas balas, senti-me envergonhada, com medo e delinquente. Não os censuro hoje. Mais tarde, quando o meu pai pedia ao meu irmão para ir ao supermercado, dizíamos todos em coro a lista: Tomate, banana e ovo.
A minha variedade alimentar era tão restrita que não me lembro nem de ter comido pão de queijo antes dos vinte e tantos. Na adolescência faltou comida, alimentava-me de alguns abacates surgidos de Deus sabe lá onde. Não ter comida é a situação mais humilhante que o ser humano pode enfrentar.
Por tudo isso, não admito que reclamem da falta de comida, ou do tipo, quando se pode abrir as portas dos armários e elas não estão vazias; por isso me dói ver a situação em que a maioria dos brasileiros estão, não tendo a possibilidade de entrarem em um supermercado para comprar comida. Muitas pessoas estão fazendo das latas e dos caminhões de lixo o seu supermercado. Enquanto isso, um bilionário está fazendo turismo no espaço. Mais do que comida, está difícil se alimentar com esperanças.
😭😭😭 as autoridades desse país precisava ler uns desabafo desses quem sabe Deus tocava no coração deles .
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