Mini-conto

Sarah em "O vestido de noiva"

O dia do casamento


Tudo conspirava contra, o dia estava chuvoso, o vestido parecia que tinha encolhido, o seu irmão que morava em outro estado ainda não havia chegado, mas não eram esses detalhes que a fariam desistir, ah não! Depois de três remarcações, dois acidentes e uma bebedeira, nada a faria descer do podium agora.



A primeira grande decepção aconteceu quando completavam dois anos de namoro: a casa não estava como eles sonhavam que estivesse para a data. Ela concordou, aceitou e até incentivou, afinal, era a casa onde iriam morar por grande parte de suas vidas. O pequeno lar nunca ficaria como nos sonhos, pois se tratava de um "puxadinho" no fundo da casa dos sogros, mas pra iniciar uma vida repleta de amor e altruísmo, segundo imaginavam, servia bem. Os cinco impedimentos seguintes aconteceram intercaladamente por motivos diversos: Morte de um primo distante, fechamento do cartório por motivo de luto, Comida que se estragou na véspera, tombo de moto sofrido pelo noivo e uma bebedeira de seu pai, cujas ações neste dia culminaram com a destruição do bolo de casamento. Depois de passar por isso tudo, não seriam uma falta de ar, uma chuvinha fria e a falta de um irmão qualquer que a fariam desistir.



O nível de stress naquela casa estava altíssimo, a noiva não tinha rosto, tinha uma carranca colada nas fuças. Ela aguardava o pior, pois era o natural para ela. A todo momento gritava com um ou outro, que, compreendendo e se apiedando da pobre sofredora, não se ofendia e não revidava.



Dessa vez, ela tinha tomado conta de tudo sozinha, não queria que nenhum dedo podre viesse urubuzar mais uma vez a sua sorte. Tinha acabado de sair do emprego e recebeu uma boa indenização, que foi gasta integralmente nos detalhes da cerimônia. Dessa vez, tudo seria impecável: A festa se realizaria em um salão de festas, tudo organizado por um Buffet, não haveria riscos de destruição do bolo nem comida estragada; a casinha já estava razoavelmente boa, e com a quantia que raspou do porquinho, terminou o enxoval; proibiu aos familiares que fizessem viagens ou cometessem atos perigosos naquele período. Parecia que dessa vez, ia dar certo!


A hora se aproximava, chamaram o padrinho da noiva para que a levasse até a igreja, pois ele era quem tinha o carro "mais novo". Ela fez o "nome do pai" e subiu no carro, parecia que estava dando certo:_"Hoje eu caso!"



Dentro do carro, naquele vai e vem, com os olhares dos pedestres e das sombrinhas se dirigindo para a noiva, ela pensou: "_Será que hoje eu caso mesmo? " Agora o medo não era o de mais uma vergonha, mas sim, o de realizar a tão esperada cerimônia. "_Será que tudo o que aconteceu não era um sinal de que eu não deveria me casar com esse homem? Será que , depois disso tudo, o casamento ainda vai durar? Será que vou me arrepender? Será que o amo?" Não encontrou resposta e nem quis pensar mais nisso. Hoje era o dia tão esperado!



Quando chegaram até a porta da igreja, a noiva notou um rebuliço anormal e o seu coração bateu mais forte. "_O que foi agora, meu Deus!" Ninguém tinha coragem de se aproximar dela e contar-lhe o motivo da muvuca, todos gesticulavam nervosamente e abanavam a cabeça, e ela ia ficando cada vez mais nervosa, o carro não a cabia mais. Finalmente, o seu pai, que havia descido do carro para saber do caso, voltou para lhe esclarecer as dúvidas:_" O noivo ainda não chegou !"_Isso para a pobre moça foi como uma estaca no coração do vampiro:_"Ele vai ter que vir, por bem ou por mal! Se não, eu quero o meu dinheiro todo de volta!"_O pai entrou no carro e o padrinho saiu cantando o pneu direto pra casa do noivo._"Toca o carro, padrinho, toca o carro que aquele desgraçado, hoje, me paga! O que ele está pensando! Gastei o meu dinheiro todo nessa porra desse casamento, e ele não me aparece na igreja! Só faz me enrolar há sete anos? Tomar no cu!"_Todos dentro do carro se apavoraram com a atitude da bela noiva, mas a compreederam perfeitamente,e, embora não demonstrassem abertamente, davam o maior apoio.



Grrrrrrrrrrrrrrr!O carro estacionou na calçada da casa dos pais do noivo, onde ficava também a futura casa dos pombinhos. A noiva entrou como um furacão pela sala e já foi logo perguntando: _"Cadê o João Luíz?" _ A sogra ficou alarmada e tentou acalmar a noiva, perguntando o motivo de tanta agitação. A futura cunhada apareceu na porta, fez uma cara de espanto ao ver a noiva, como se tivesse algo sério a esconder. Como perceberam que a noiva precisava saber da verdade, o sogro finalmente abriu a boca:_"O João Luíz não quer casar!"_Nossa, os olhos da mulher pareciam ter se incendiado naquele momento, as fagulhas se estalavam em suas órbitas. A cunhada correu para o quarto e a sogra colocou as duas mãos na cabeça, enquanto a pobre escancarava a sua boca e corria em direção ao quarto do noivo.



_João Luíz, seu filho de uma égua, cê vai me dar o meu dinheiro e é agora, seu desgraçado!Eu gastei todo o meu dinheiro que recebi da firma e você me faz uma sacanagem dessas? Isso eu não vou aceitar não, quero tudo e quero agora!


Quando ela olhou pro homem, deitado na cama, claramente bêbado até a alma, teve o ódio das mães que tem o seu filho morto. Aquele homem dava pena e nojo, estava com o olhar choroso, meio vestido meio pelado, uma triste figura. Depois que a moça esbravejou até não querer mais, falou do seu dinheiro, dos seus gastos, dos casamentos não realizados, ela se lembrou de perguntar:



_Uai, João Luiz, afinal de contas, por que é que você não quer se casar mais?



O homem, com a voz trêmula e fanhosa típica dos bebuns, respondeu:



_O seu irmão não trouxe o sapato pra mim...



Depois dessa, apareceu um sapato "muito do ridículo" para o noivo, e o casamento se realizou, não como nos sonhos, mas como era esperado.

Comentários

  1. Adorei o conto, Lu.
    Me prendeu do início ao fim. E o final foi surpreendentemente engraçado!
    rsr
    Gostei demais!
    beijos
    Adélia Carvalho

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  2. Hahaha!
    Confesso que essa história foi inspirada em uma história real, também morri de rir quando me contaram.Mas os detalhes foram inventados.
    Beijos!

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