Hoje eu vi um zumbi.
Eu corri para pegar o ônibus, estava quase atrasada. Fiquei em pé no ponto, juntamente com outras pessoas, quando ele se aproximou mendigando. Era um rapaz moreno, camisa preta desbotada, calças de moletom, furadas nos fundilhos, chinelos, cabelos sem corte, sujos, ele estava sujo inteiro. Pedia dinheiro, qualquer coisa, 50 centavos para comprar comida, segundo ele. Olhei seus dedos, todos com pontas queimadas, negros e feridos. Cacei 50 centavos e dei-lhe. Uma senhora que lá também estava disse, "Você vai é pra Vila daqui a pouco comprar craque, eu sei". Ele não ouviu, não ligou, não deu a mínima e continuou pedindo. Foi até o outro lado da rua e voltou para pedir para os novos esperantes de ônibus. Desta vez, ele pedia dez reais, insistia, dizia que a comida custava isso. Quando ele havia ido para o outro lado, pude observar uma lata de refrigerante em seu bolso e o isqueiro em suas mãos. Agora seu corpo tremia. Ele não via nada, nem tampouco se importava. Ele não tinha alma. Ele não era gente.
Senti um vazio na alma, se a tenho. Tenho algo que aquele zumbi não tinha, porque a ele nada importava neste mundo, a não ser a urgência que sentia de saciar a todo custo seu vício. Ele pedia, mas seria capaz de qualquer coisa. Qualquer coisa.
Para aquele individuo, futuro não é algo que exista em sua mente ou projeto. Laços, talvez não saiba mais o sentido. Aquele individuo estava no fundo do poço da inexistência. É a coisa mais triste que já vi.
Pensar que isso está em Ouro Preto, pensar que todos sabem o que acontece, e nada é feito. Todos sabem. Todos.
Pensar que um indivíduo pode perder-se, perder a alma, assim, sem que nem se dê conta. De repente, está com amigos, ou inimigos, ou rodeado por fantasmas, e, de repente, de brincadeira, começa a trilhar o caminho da escuridão e nunca mais volta. Coisas como se limpar, comer, namoro, família, deixam de existir.
Aquele zumbi roubou um pedaço de mim. Que deus nos proteja.
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