O Brasil do futuro


Zezinho nasceu na favela do Taquara. O pai vivia bêbado pelas calçadas das ruas, dizendo gracejos para as meninas e para os postes, pois não existia diferenciação naquela situação. A mãe segurava a família de cinco filhos, trabalhando em casa de médicos  e cuidando de seus três filhos. Na casa dela, os maiores cuidavam dos menores. Zezinho tinha que ir para a escola de manhã e ajudar a tomar conta dos irmãos à tarde, quando não tinha que fazer algum serviço para ganhar uns trocadinhos ou ir pegar o pai na sarjeta. Era a vida, não nascera granfino. Na escola, as coisas da matemática não entravam na cabeça, a fome gritava demais nos ouvidos, assim como os gritos do pai descendo as escadas na madrugada passada que anunciavam mais uma noite de desespero. Era chamado de negrinho do pastoreiro e excluído dos grupos, odiava aquela escola mais que a própria vida, não vingou nela. Cresceu e foi trabalhar como entregador de compras, carregava caixas pesadas o dia todo para ganhar um salário mínimo. Um dia, sem mais nem menos, o patrão o demitiu para cortar gastos. Ele não recebeu nada. Ele não podia ir até o ministério da justiça, porque já não existia. Desse jeito, de acordo com a reforma da previdência, nunca teria tempo suficiente para se aposentar. Ele ficou imaginando que o patrão não gostara do pedido de aumento, ele queria comprar enxoval para o filho. De acordo com as novas leis, os acordos deveriam ser feitos entre empregador e funcionário, não através de sindicatos. Zezinho saiu e lá estavam na fila desesperados aceitando ganhar menos que ele, e se ele fosse recorrer, sem advogados, e perdesse da empresa milionária, ele teria que arcar com todos os custos, e ainda corria o risco de ser marcado como "aquele que recorria" e não conseguir mais emprego. Ficou quieto. Disseram que o mercado seria capaz de trazer justiça por ele mesmo, mas o mercado visa lucro, não visa justiça. Zezinho caiu na bebedeira, e caiu cantando o tchan. Pensaram que ele fosse gay e meteram-lhe um tiro na cara no meio da rua depois de uma briga; era normal qualquer homem de bem, gay ou não, ter arma para defender a sua família das ameaças comunistas e homossexuais negras. Morreu atrapalhando o tráfego. Seu filho, estará no círculo, mas não terá direito a escola, vai ter que estudar através de um computador. Aham. É o fim.

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