Como ser uma feminista de araque


Manu foi criada por uma mãe super protetora que resolvia todos os seus problemas, participava de todas as reuniões, convocações, celebrações e vivia em função da pequena princesa. Quando algum amiguinho fazia algo que a contrariasse, a mãe era a primeira a colocar os pés na escola para tirar satisfações e deixar bem claro que "com a filha dela dela, não"! Sempre que tinha um arranhão, a mãe a levava para o hospital, tinha sempre um xarope na manga. Mas, apesar de todos os "zelos", sua alimentação era totalmente recheada por alimentos calóricos que a menina exigia sem encontrar resistência. Não tinha hora para comer, nem dormir, era livre.

Na adolescência, a mãe continuou limpando suas sujeiras e resolvendo seus problemas; nunca lavou um copo, passava os dias de pernas para o ar, se alimentando de teorias sobre liberdade, ativismo, e tudo o que consumia, teorias, nunca prática. Exigia dinheiro para a faculdade, para as baladas, para as viagens, fazia dívidas e dava o endereço da mãe. Viajava para participar de protestos pelas minorias, pelos animais, pelo comunismo, feminismo, chegava em casa e deixava a mãe lavar as suas calcinhas enquanto a pobre se recuperava de um tombo depois de vertigens na beirada da escada; de vez em quando, declarava o seu amor e admiração por sua mãe guerreira nas redes sociais, enquanto discutia com opinistas de outras ideologias.

Depois de participar de 352 manifestações, experimentar todas as drogas lícitas e ilícitas, queimar todos os soutiens, beijar todos os tipos de bocas que encontrou,  de viver toda a liberdade que quis viver, casou-se e teve filhos, que criou, quando podia, como se fossem pequenos adultos livres e capazes de decidirem tudo, desde se iriam de uniforme ou não para escola, até rasparem e pintarem o cabelo de lilás, com cinco anos. Para ela, não fazia muita diferença, estava muito ocupada lutando pelo mundo, não tinha tempo para comparecer às reuniões de pais, ou de preparar um jantar de vez em quando. Mas, pensava que era absurdo passar uma camisa para o marido, e mais absurdo ainda, não ser levada por ele de carro para onde bem entendesse. Tudo era absurdo, e tudo era exigência demais, separou-se. Libertou-se.

Foi viver a vida de protestos de Facebook e de liberdade total, livre de todas as responsabilidades; postava fotos contra o machismo de camisolinha sexy e maquiagem arrebatadora.  Eram 24 postagens por dia, desde declaração de amor aos filhos, a fotos de camisetinha vermelha no meio da multidão. Oferecia-se para cuidar dos filhos das mães solteiras, participava de projetos voluntários, mas ainda não pagava suas contas. Era uma grande feminista. Não era como a Maria do outro lado da rua, que sempre limpou o seu próprio banheiro e carregou seus filhos por onde quer que fosse, ensinando-lhes que não deveriam tratar mal e nem deixarem-se tratar mal. Maria ensinou-os a respeitar os outros, a assumir suas responsabilidades, a economizar, a cozinhar sua própria comida, os meninos e as meninas. Maria ensinou-os a serem solidários uns com os outros e a ajudarem-se no que um fosse mais fraco que o outro. Maria não aceitou que nenhum babaca entrasse em sua casa, mas gostava de ser livre quando podia. Usou e fez o que quis, mas deu limites aos filhos para que pudessem questioná-los quando fosse o momento certo, para que não se preocupassem com o que não fossem ainda capazes de resolver ou experimentar. Maria, sim, protegeu seus filhos. Ela encontrou um bom companheiro, com quem compartilhou muitas coisas, e que adorava cozinhar. Ela não se preocupava em ter que passar suas camisas, sempre passou melhor e mais rapidamente. Maria participava de mutirões no bairro, participava das reuniões na câmara e ajudava aos que precisavam. Maria não precisava provar nada. Maria era toda vermelha, não só a camisetinha sexy.


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